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Estranho “asim”? Qual será o futuro da língua?

João Pinheiro
Recentemente, vivemos a mais atual mudança na ortografia da Língua Portuguesa, o novo acordo iniciado em 2009. A “esphera lingüística” portuguesa, que já foi assim, tornou-se como a vemos hoje e pode ficar “asim” em breve. Veja como poderá estar nossa língua em alguns anos!


Você já se perguntou sobre o futuro da língua portuguesa? Nosso idioma passa por tantas alterações que fica difícil imaginar quais serão as regras daqui a alguns anos!

No meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
Carlos Drummond de Andrade, in “Alguma Poesia”

Em algum momento da sua vida você já deve ter lido esse poema de Carlos Drummond de Andrade, não é mesmo? Pois saiba que o consagrado poeta, considerado o maior do século XX, recebeu inúmeras críticas por causa desses versos.

Ele colecionou recortes de jornal com artigos sobre o poema e cada opinião dos “entendidos” no assunto, e quando os versos completaram quarenta anos, Drummond publicou um livro divulgando todas as críticas recebidas, uma espécie de biografia de “No meio do caminho”.

↪ Mas o que haveria de errado com o poema publicado em 1928 na famosa Revista de Antropofagia? Por que ele despertou tanto interesse e provocou tanta celeuma?

Os versos de “No meio do caminho” foram considerados pobres e repetitivos, rejeitados por conta de seu “brasileirismo grosseiro, erro crasso de português” [essas foram as palavras usadas na crítica feita pelo jornal Folha da Manhã em 1942], uma crítica nada amistosa que condenava a substituição do verbo “haver” pelo verbo “ter”, considerado coloquial demais para ser usado na Literatura.

Drummond ficava aborrecido com a polêmica em torno de seus versos e com a incapacidade que seus críticos tinham em compreender que a língua e a fala são elementos indissociáveis. O poeta já sabia disso há mais de oitenta anos, mas até hoje os “erros de português” são discutidos à exaustão, na maioria das vezes essas discussões desconsideram importantes elementos, como as variações linguísticas.

Darwinismo “linguístico”


Felizmente, a língua portuguesa evoluiu, e substituir o verbo “haver” pelo verbo “ter” não rende mais nenhuma notinha pequenininha no canto do jornal.

Isso nos traz um questionamento interessante, que nos faz lembrar que a língua é um organismo vivo e dinâmico. Mas, afinal, qual será o futuro da língua portuguesa?

O que era absurdo há oitenta anos, hoje é absolutamente aceitável. Será que o que é absurdo hoje também será aceitável daqui a, por exemplo, cem anos? Provavelmente sim.

↪ Os brasileiros de hoje dificilmente travariam um diálogo corriqueiro com brasileiros que viveram há duzentos anos, assim como nós seríamos possivelmente incompreendidos por brasileiros dos anos 2200. Já imaginou como seria engraçado esse encontro de gerações?

O português brasileiro é extremamente receptivo se comparado ao português lusitano, que, na defesa quase quixotesca do idioma, execra estrangeirismos e neologismos. No Brasil, a língua portuguesa é uma menina simpática, recebe bem novos vocábulos — vindos sobretudo do inglês — e, às vezes, até arruma um espaço no dicionário para que essas novas palavras fiquem mais à vontade em nossa lexicografia.

Importar e adaptar palavras não é exatamente uma novidade: no início do século XX o francês era um dos idiomas mais importantes justamente porque a França exercia grande poder sobre o mundo.

↪ Diz placa, “Nesta casa faleceu, em 18 de janeiro de 1589, o pároco desta freguesia do coração de Jesus, Pe. José Ignacio de Gouvêa Coutinho. Fique esta lápide aqui perpetuando a augusta memória das suas virtudes e grata saudade dos que foram seus paroquianos. Janeiro de 1888”.

Então chique era falar francês e importar o máximo possível de vocábulos desse idioma. Depois, com a ascensão do poder estadunidense, a língua inglesa virou uma febre mundial, então copiamos expressões e palavras do inglês, subservientes ao seu poder cultural.

Não se espante se de repente o mandarim, língua oficial da China, começar a infiltrar-se em terras brasileiras, porque a História prova que a tendência é copiarmos palavras de outros países que se tornaram importantes.

Não se espante também se de repente falares considerados incultos começarem a ganhar prestígio linguístico, porque a moda agora é valorizar as diferenças entre grupos [viva à globalização!].

Então alguns dialetos regionais do Brasil podem ganhar notabilidade e respeito, corroborando a ideia das variações linguísticas.

O gerundismo, vício de linguagem que hoje é visto com maus olhos pelos estudiosos da língua, pode “estar vindo” a ser parte integrante da norma culta, basta que ganhe prestígio e alcance textos escritos sem que fiquemos espantados por isso.

A grande verdade é que a evolução da língua portuguesa é visível, ela é cotidianamente modificada por seus falantes, seus verdadeiros donos. Somos nós quem decidimos quais palavras ficarão consagradas pelo uso e quais palavras serão descartadas pela falta de adesão dos falantes.

As mudanças são tão rápidas que gramáticas e dicionários mal conseguem acompanhar, ficam aguardando que expressões e palavras permaneçam no idioma para só assim fazerem alterações nos compêndios. Portanto, o que hoje se configura como inovação da língua portuguesa poderá vir a ser padrão na escrita para nossos netos! Quanto à pergunta sobre o futuro da língua, a resposta só o tempo trará.​

Exemplos da evolução da língua portuguesa:

↪ Na modalidade oral, e até mesmo na modalidade escrita, já substituímos os pronomes pessoais clássicos por outros mais coloquiais:

Nós não queremos só comida, nós queremos comida, diversão e arte” → “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”.

↪ O futuro do presente vem sendo substituído pelo futuro perifrástico:

“Eu amarei até o fim de meus dias” → “Eu vou amar até o fim de meus dias”.

↪ A ênclise, pronome posto após o verbo, também dá sinais de que em breve desaparecerá:

Amo-te tanto, meu amor!” → “Eu te amo tanto, meu amor”.

Mudansas estranhas?


Quem já estudou gramática sabe: a língua portuguesa é um mundaréu de regrase exceções. Isso torna a ortografia um dos grandes desafios para quem quer escrever de acordo com a norma culta.

Para o professor Ernani Pimentel, que já causou muita polêmica na mídia por defender uma escrita mais simples, nosso idioma ficaria melhor sem tanta confusão entre gês e jotas, agá e sem agá, hífen ou sem hífen.

Não tem jeito: as exceções das regras têm de ficar na cabeça na base do decoreba. Pimental é contra. “Hoje não interessam mais fórmulas dogmáticas e irracionais. As regras têm de ser lógicas, baseadas no entender e raciocinar, diz.

Atualmente, cerca de 400 horas são gastas para ensinar ortografia no ensino básico do Brasil. Para ele, a simplificação das regras e a eliminação das exceções permitiriam usar esse tempo para aprender outras coisas.

Pimentel lista sugestões para tornar mais fácil a escrita. O ‘h’ sumiria. As palavras com som de “jê/gê” ou “ji/gi” seriam escritas com ‘j’, não com ‘g’. “Nas línguas nórdicas, o ‘g’ tem sempre som de ‘gue’. “Aqui deveria ser assim”, diz. O ‘s’,’c’,’ç’ se resumiriam a uma única letra quando usadas no meio da palavra. Já a letra ‘k’ entraria de vez na nossa língua, não apenas em palavras estrangeiras.

↪ Sendo asim, em breve estaremos escrevendo desa maneira diferente e estranha nos dias de oje. Será ke ese novo modo entrará em vigor e teremos palavras como: jelo, engia, omem, keijo?

“Acordo ortográfico é retrocesso, não evolução. Pimental é um dos maiores críticos do Acordo Ortográfico de 1990, que vigora por aqui desde janeiro de 2009. “O Brasil está falando sozinho. Todos os outros países que usam o português sabem das enormes barreiras que impedem o aprendizado das novas regras, diz.

Entre os países signatários, o Brasil determinou que, até o fim de 2012, coexistem as normas da antiga e da nova grafia. Depois disso, só as regras do Acordo serão aceitas. Portugal estendeu o prazo para 2015, mas pretende colocar a lei em prática apenas em 2018. Moçambique e Angola não vão colocar as normas em vigor. Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste aguardam a implementação.

Segundo o professor, o Acordo desrespeita algumas de suas determinações. Por exemplo, de que deveria ter sido publicado o Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa, com termos técnicos e científicos acordados por todos os envolvidos. Mas até hoje esse documento não existe. O que vale é o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa [Volp], que se fundamenta apenas em Brasil e Portugal.

“Isso já é um desrespeito ao Acordo, pois há muitas contradições entre este e o Volp. O primeiro diz que a grafia correta de azeite de dendê é sem hífen, enquanto o Volp sugere com hífen, esclarece. Já as palavras an-hidro, co-herança, re-humanizar são escritas dessa maneira pelo Acordo, mas perdem o hífen no Volp.

Por lei, a ABL [Academia Brasileira de Letras], é obrigada a ter a aprovação do Congresso Nacional e das oito partes envolvidas em qualquer alteração que promove no Acordo. “Mas eles incluem ou excluem regras sem considerar suas próprias bases legais.

No que diz respeito ao hífen, por exemplo, a ABL incluiu prefixos que eliminavam o hífen antes do h sem consultar ninguém. “O trema, por exemplo, nunca deveria ter sido excluído da nossa língua”, defende.

Ridículas e patéticas?


Apesar dos argumentos de quem propõe as mudanças, as medidas têm rejeição por parte de alguns linguistas. O filólogo e professor da UnB [Universidade de Brasília], Marcos Bagno, não economiza críticas ao falar da proposta: “São ridículas, patéticas e merecem todo o desprezo da comunidade de linguistas do Brasil”, diz.

Para Bagno, o argumento de que as novas mudanças facilitariam o aprendizado não é válido. “Aprender a escrever em chinês é muito mais complicado do que aprender a escrever em português, e 94% dos chineses são alfabetizados. A questão é alfabetizar e letrar a população. A ortografia pode ser qualquer uma, aponta.

Pimentel aponta que as críticas à proposta sempre vêm da academia e não de quem ensina para crianças. “Há pessoas que defendem a etimologia na construção da ortografia. Mas há várias regras em que ela é quebrada. Temos que decidir sermos mais práticos. Assim, as crianças podem aprender melhor, responde.




Essa é uma questão que ainda irá causar inúmeras discussões por parte dos linguistas e “revolucionários da língua”. Não esqueçamos que nossa língua tem uma formação, uma história de desenvolvimento e evolução. Não seria essa alteração um esquecimento do passado do português brasileiro? Diga-nos [ou nos diga, como preferir] qual a sua opinião sobre o assunto!

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Fonte: Brasil Escola; UOL; Simplificando a Ortografia
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